
Resistência cotidiana, fugas e a dominação negociada:
Author(s) -
Karl Monsma
Publication year - 2014
Publication title -
raízes
Language(s) - Portuguese
Resource type - Journals
eISSN - 2358-8705
pISSN - 0102-552X
DOI - 10.37370/raizes.2013.v33.388
Subject(s) - humanities , political science , philosophy , law and economics , sociology
Os campeiros escravizados nas estâncias de criação de gado no Rio Grande do Sul no século XIX trabalhavam a cavalo, armados e sem fiscalização constante em uma região perto de fronteiras internacionais, o que certamente facilitava sua resistência, especialmente as fugas. A evidência examinada aqui sobre as relações entre os senhores e estes cativos confirma aspectos centrais do argumento de James Scott, mostrando que a maioria desses escravos não acreditava que seu cativeiro fosse justo e que a resistência cotidiana e de pequena escala proporcionava melhorias nas suas condições materiais e simbólicas de vida. Entretanto, a evidência não é totalmente coerente com outro argumento de Scott, segundo o qual a deferência dos subalternos é simplesmente fingida e as exigências deles são formuladas dentro da lógica hegemônica por motivos puramente estratégicos. Os campeiros cativos não se rebelavam ou evadiam a cada oportunidade que aparecia. A evidência sugere que, dado a existência da escravidão, eles reconheciam as normas e obrigações morais que haviam se desenvolvido ao longo do tempo para regular as relações entre senhores e cativos. Essas normas implicavam obrigações de ambos os lados e, em muitos casos, constituíam a melhor maneira de limitar a brutalidade dos senhores ou capatazes e de ganhar algumas melhorias dentro do sistema. Existe uma diferença importante entre a legitimidade de um sistema de dominação e a autoridade de indivíduos com poder dentro do sistema. Como indivíduos, os senhores podiam ganhar o respeito dos cativos pelo tratamento relativamente decente e pela distribuição de favores. Os escravos estavam enredados em uma teia de relações pessoais de poder que minavam sua solidariedade, separando e individualizando-os, premiando a lealdade a senhores específicos e punindo a rebeldia.