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Remuneração médica sob desempenho e qualidade de assistência à saúde
Author(s) -
F. Di Porto,
Leonardo Carnut
Publication year - 2021
Publication title -
journal of management and primary health care
Language(s) - Portuguese
Resource type - Journals
ISSN - 2179-6750
DOI - 10.14295/jmphc.v12.1065
Subject(s) - humanities , political science , philosophy
Desde os anos 2000, os problemas da crise na assistência no âmbito do SUS têm sido atribuídos à ineficiência dos processos gerenciais como por exemplo o modelo de pagamento dos profissionais de saúde. O pagamento por desempenho tem sido apontado por alguns autores como um modelo de remuneração viável para superar a crise relacionada a baixa qualidade dos atendimentos aos usuários do sistema de saúde pública brasileiro. No entanto, persistem dúvidas sobre, se o modelo de remuneração baseada no desempenho pode melhorar o cuidado em saúde, e, em especial, o atendimento médico. Segundo o documento de 2002 “Medical Professionalism in the New Millennium: A Physician Charter”, os três princípios fundamentais do profissionalismo médico são o bem-estar do paciente, a sua autonomia e a justiça social. Este documento espelha a evolução do conceito de profissionalismo e o seu vínculo direto às mudanças da relação médico-paciente e ao papel do médico na sociedade. Alguns autores citam que diversos fatores podem interferir no desempenho médico no cenário da consulta, entre eles: o conhecimento técnico, a satisfação com o trabalho, a receptividade percebida às orientações dadas, além da própria formação acadêmica. Já outros autores pensam que, ao tomar como ponto de partida o “desempenho do médico”, creem que este está mais relacionado com aquilo que o médico faz, a forma como faz e as condições em que o faz, procurando-se estabelecer uma base de trabalho para a criação de critérios de avaliação de desempenho que traduzam a realidade vivida pelas instituições de saúde. Na atualidade, os conceitos de desempenho profissional médico vem sendo enquadrados nas perspectivas corporativas que relacionam o aumento da produtividade com eficiência, porém a dificuldade de medir resultado em saúde como produto torna as avaliações da qualidade de assistência em saúde um grande desafio. Os serviços de saúde são considerados por alguns autores como serviços “puros”, ou seja, o resultado do processo de trabalho é o próprio trabalho sem necessariamente se ter um “produto” resultante. Outros autores enfatizam que as avaliações têm que atender também às necessidades dos atores da avaliação e ter aceitabilidade pelos mesmos a fim de que os resultados sejam legitimados. Neste contexto, pergunta-se quais são as evidências entre a remuneração médica sob desempenho profissional e a qualidade de assistência prestada? Assim, o objetivo deste estudo foi identificar na literatura científica evidências sobre a relação entre a remuneração médica sob desempenho e suas relações com a qualidade da assistência prestada ao paciente. Tratou-se de uma revisão sistemática integrativa desenhada com o intuito de sistematizar artigos publicados sobre o tema, integrar seus resultados e responder aos objetivos descritos. A revisão foi realizada primeiramente através de uma busca no DeCS pelos descritores considerados chave no tema em que se pretende abordar. Foram criados três polos de análise: (1) descritores do fenômeno estudado: “tabela de remuneração de serviços” e “planos de pagamento por serviço prestado”; (2) descritor da população estudada: “médicos”; (3) descritores do contexto estudado: “análise e desempenho de tarefas”; “avaliação de desempenho profissional”; “desempenho profissional”; “garantia de qualidade dos cuidados de saúde”; “controle de qualidade”; “qualidade da assistência a saúde” e “competência clínica”. Em seguida, foi realizada a seguinte estratégia de busca usando os descritores escolhidos no banco de dados da Biblioteca Virtual em Saúde na seguinte sequência, mesclando com AND, os três pólos (1) AND (2) AND (3) e formando a seguinte sintaxe (mh:(mh:("tabela de remuneracao de servicos" OR "planos de pagamento por servico prestado"))) AND (tw:("medicos")) AND (mh:(mh:("analise e desempenho de tarefas" OR "avaliacao de desempenho profissional" OR "desempenho profissional" OR "garantia da qualidade dos cuidados de saude" OR "controle de qualidade" OR "qualidade de assistencia a saude" OR "competencia clinica"))). Não foi delimitado nenhum período específico na busca e o resultado recuperou um total de 165 publicações. Realizado a leitura dos títulos e resumos de cada publicação, as repetições foram removidas e os critérios de inclusão aplicados. São eles: artigos disponíveis na íntegra para leitura do texto completo em língua portuguesa, inglesa ou espanhola e serem relevantes à pergunta de investigação. Os critérios de exclusão foram: artigos disponíveis em outras línguas diferentes das citadas acima, publicações diferentes de artigos científicos e que não tinham seu resumo ou o texto completo para leitura ou não estarem relacionados ao tema de investigação. Dos 165 artigos, foi excluído 1 artigo repetido, 9 artigos publicados em línguas diferentes dos critérios de inclusão. Foram excluídos 111 artigos por não se relacionarem a pergunta de investigação. Finalmente, foi feita a leitura completa de 44 artigos. Foi realizada uma pré-análise relacionando o pagamento por desempenho dos médicos da atenção primária na Inglaterra com metas pré-definidas de indicadores de processo nos contratos do NHS. O pagamento máximo aos médicos é condicionado a uma meta pré-estabelecida que variava entre 50-90%, dependendo do indicador. Além disso, havia critérios de exceção pré-definidos pela associação médica. Observou-se que houve melhoria nestes indicadores de qualidade após instituição destes contratos, porém, como o pagamento acontecia antes de 100% da população ser abrangida, muitos pacientes deixaram de receber cuidados que podem mudar a morbimortalidade de determinada doença. Além disso, observou-se uma variação no número de pacientes que entravam em critérios de exclusão do cuidado, demonstrando uma grande variação na prática clínica. Por estas razões, alguns autores refletem sobre a fragilidade da definição dos indicadores de processo na tradução de melhor qualidade de assistência prestada já que eles avaliam um cuidado clínico específico num momento e não medem a continuidade do cuidado e nem o estado de saúde do indivíduo em si.