
parafuso a menos, um parafuso a mais
Author(s) -
Lilian Honda
Publication year - 2021
Publication title -
revista desassossego
Language(s) - Portuguese
Resource type - Journals
ISSN - 2175-3180
DOI - 10.11606/issn.2175-3180.v13i25p37-50
Subject(s) - philosophy , humanities
Os sofrimentos de ordem psíquica são temas recorrentes na poesia de Adília Lopes, seja num registro marcadamente crítico ou irônico, quando não de pura invectiva, contra profissionais da psiquiatria e da psicanálise, ou na alusão aos psicofármacos, seus efeitos adversos no organismo e a displicência com que são prescritos. A questão se torna mais instigante quando se considera o jogo autobiográfico que atravessa a obra adiliana (nesse caso, um exercício inelutável) e o fato de a poetisa ter tornado público em entrevistas, mais de uma vez, o mal psíquico de que padeceu. Seus versos podem relacionar, por exemplo, um tema como a obesidade à consequência do uso de psicofármacos, passando pela imposição de um padrão de beleza ao corpo feminino, encadear esse tópico a questões do mundo do trabalho ou mesmo desdobrar-se em indagações sobre comportamentos histórica e socialmente determinados como aceitáveis. Os múltiplos sentidos desse jogo envolvendo a conformidade às regras e os sofrimentos psíquicos na poética de Adília Lopes tornaram necessário buscar uma conceitualização mais precisa de “normalidade” e “anormalidade” a partir da reflexão filosófica de Georges Canguilhem, autor de O Normal e o Patológico, na qual são investigados os paradigmas que estruturaram o conhecimento médico-científico e as noções de saúde/doença, normalidade/patologia e anomalia, conceitos que passaram a formar a base da multiplicação de dispositivos reguladores em todas as esferas da vida social.